quarta-feira, novembro 28, 2012

Conceição.

A brava. A forte. A lutadora. Vó, eras rija pá.

Mulher das beiras e à antiga, arriscaste o futuro como muitos nunca o farão. Fizeste tudo e sempre tudo para a família. Alimentaste anos a fio um batalhão de filhos, genros, noras, netos e netas, e nunca torceste o nariz por causa disso. Nem mesmo quando chegavas à mesa e vias que não havia nem mais um espacinho para te sentares. Ainda que alguém tivesse a ideia de se levantar, davas-lhe um raspanete e ias para o sofá comer, com o prato ao colo, meio desengonçada, mas com aquele sentimento que a prova estava superada. A família estava reunida e apesar de não haver espaço para todos à mesa, havia amor do bom naquela casa. Amor naquela feijoada à brasileira, amor na bola de sardinha, amor no macarrão, amor em tudo o que punhas a mão.

O orgulho nos netos era mais que sabido. Mas o orgulho que tinhas na "minha iAna, na minha sSCinda e no meu Carlos"...arrepiava-me qualquer coisa aqui no coração. Acho que era a felicidade a passar por mim, de saber que os nossos pais foram tão amados como nós somos.

Sabias receber primos e primas, tios e tias como ninguém. O quarto dos hóspedes estava sempre ao dispor, a mesa sempre forrada com comida bem portuguesa para os "brasileiros" matarem a saudade. Adorava ver o teu sotaque da beira alta misturar-se com o sotaque paulista e carioca, em histórias sobre o filho da prima do tio que tinha agora dois netos que eram genros da irmã. Eras o porto de abrigo em portugal, para a maior família do mundo.

Sempre foste uma pessoa que não gostava de dar nas vistas. Para mim essas são as melhores. Dão o que têm e o que não têm e nunca pedem nada em troca, nem mesmo reconhecimento. Mas ficas já a saber que sempre te admirei. Sempre te reconheci. Sempre apreciei o que fizeste por todos e por mim.

Perdeste o teu amor cedo demais. Perdeste o teu amor da pior maneira possível. Perdeste-o e nunca mais te encontraste... Para mim, a avó Conceição que eu vou recordar já partiu há muito tempo. A que ficou, foi-se arrastando.

Sinto que estavas cansada de não seres tu. E compreendo. Querias muito o reencontro com o teu Augusto.

Não te preocupes com nada. Fizeste o teu trabalho da melhor maneira, com brio e amor.
Nós, cá continuaremos...incompletos, mas unidos e felizes.

Até um dia vó Conceição.

*

quinta-feira, setembro 06, 2012

Eu próprio.


The Drifter.



Se há coisas que me enchem os olhos, a alma e o coração, são coisas como esta. Já o tinha visto há uns anos. Vejo-o novamente, desta vez legendado, e não me canso deste tipo de registo. Já o into the wild mexeu comigo. Este mexe também. A busca de sonhos e da felicidade, será sempre o nosso objectivo. E é bom perceber que não é preciso muito. Está tudo dentro de nós.

He-Man.



Felicidade era brincar com estes.

sexta-feira, agosto 24, 2012

Um canhão pelo cú


14 de Agosto de 2012. "Um canhão pelo cú" e "As relações impossíveis: Economia real- Economia financeira", eram os dois títulos do texto que Juan José Millas publicava na secção de cultura do El Pais. Em poucos dias  tornou-se viral: 19000 shares no Facebook, 15 mil tweets, um país indignado. 
 

Se percebemos bem - e não é fácil, porque somos um bocado tontos -, a economia financeira é a economia real do senhor feudal sobre o servo, do amo sobre o escravo, da metrópole sobre a colónia, do capitalista manchesteriano sobre o trabalhador explorado. A economia financeira é o inimigo da classe da economia real, com a qual brinca como um porco ocidental com corpo de criança num bordel asiático.
Esse porco filho da puta pode, por exemplo, fazer com que a tua produção de trigo se valorize ou desvalorize dois anos antes de sequer ser semeada. Na verdade, pode comprar-te, sem que tu saibas da operação, uma colheita inexistente e vendê-la a um terceiro, que a venderá a um quarto e este a um quinto, e pode conseguir, de acordo com os seus interesses, que durante esse processo delirante o preço desse trigo quimérico dispare ou se afunde sem que tu ganhes mais caso suba, apesar de te deixar na merda se descer.
Se o preço baixar demasiado, talvez não te compense semear, mas ficarás endividado sem ter o que comer ou beber para o resto da tua vida e podes até ser preso ou condenado à forca por isso, dependendo da região geográfica em que estejas - e não há nenhuma segura. É disso que trata a economia financeira.
Para exemplificar, estamos a falar da colheita de um indivíduo, mas o que o porco filho da puta compra geralmente é um país inteiro e ao preço da chuva, um país com todos os cidadãos dentro, digamos que com gente real que se levanta realmente às seis da manhã e se deita à meia-noite. Um país que, da perspetiva do terrorista financeiro, não é mais do que um jogo de tabuleiro no qual um conjunto de bonecos Playmobil andam de um lado para o outro como se movem os peões no Jogo da Glória.
A primeira operação do terrorista financeiro sobre a sua vítima é a do terrorista convencional: o tiro na nuca. Ou seja, retira-lhe todo o caráter de pessoa, coisifica-a. Uma vez convertida em coisa, pouco importa se tem filhos ou pais, se acordou com febre, se está a divorciar-se ou se não dormiu porque está a preparar-se para uma competição. Nada disso conta para a economia financeira ou para o terrorista económico que acaba de pôr o dedo sobre o mapa, sobre um país - este, por acaso -, e diz "compro" ou "vendo" com a impunidade com que se joga Monopólio e se compra ou vende propriedades imobiliárias a fingir.
Quando o terrorista financeiro compra ou vende, converte em irreal o trabalho genuíno dos milhares ou milhões de pessoas que antes de irem trabalhar deixaram na creche pública - onde estas ainda existem - os filhos, também eles produto de consumo desse exército de cabrões protegidos pelos governos de meio mundo mas sobreprotegidos, desde logo, por essa coisa a que chamamos Europa ou União Europeia ou, mais simplesmente, Alemanha, para cujos cofres estão a ser desviados neste preciso momento, enquanto lê estas linhas, milhares de milhões de euros que estavam nos nossos cofres.
E não são desviados num movimento racional, justo ou legítimo, são-no num movimento especulativo promovido por Merkel com a cumplicidade de todos os governos da chamada zona euro.
Tu e eu, com a nossa febre, os nossos filhos sem creche ou sem trabalho, o nosso pai doente e sem ajudas, com os nossos sofrimentos morais ou as nossas alegrias sentimentais, tu e eu já fomos coisificados por Draghi, por Lagarde, por Merkel, já não temos as qualidades humanas que nos tornam dignos da empatia dos nossos semelhantes. Somos simples mercadoria que pode ser expulsa do lar de idosos, do hospital, da escola pública, tornámo-nos algo desprezível, como esse pobre tipo a quem o terrorista, por antonomásia, está prestes a dar um tiro na nuca em nome de Deus ou da pátria.
A ti e a mim, estão a pôr nos carris do comboio uma bomba diária chamada prémio de risco, por exemplo, ou juros a sete anos, em nome da economia financeira. Avançamos com ruturas diárias, massacres diários, e há autores materiais desses atentados e responsáveis intelectuais dessas ações terroristas que passam impunes entre outras razões porque os terroristas vão a eleições e até ganham, e porque há atrás deles importantes grupos mediáticos que legitimam os movimentos especulativos de que somos vítimas.
A economia financeira, se começamos a perceber, significa que quem te comprou aquela colheita inexistente era um cabrão com os documentos certos. Terias tu liberdade para não vender? De forma alguma. Tê-la-ia comprado ao teu vizinho ou ao vizinho deste. A atividade principal da economia financeira consiste em alterar o preço das coisas, crime proibido quando acontece em pequena escala, mas encorajado pelas autoridades quando os valores são tamanhos que transbordam dos gráficos.
Aqui se modifica o preço das nossas vidas todos os dias sem que ninguém resolva o problema, ou mais, enviando as autoridades para cima de quem tenta fazê-lo. E, por Deus, as autoridades empenham-se a fundo para proteger esse filho da puta que te vendeu, recorrendo a um esquema legalmente permitido, um produto financeiro, ou seja, um objeto irreal no qual tu investiste, na melhor das hipóteses, toda a poupança real da tua vida. Vendeu fumaça, o grande porco, apoiado pelas leis do Estado que são as leis da economia financeira, já que estão ao seu serviço.
Na economia real, para que uma alface nasça, há que semeá-la e cuidar dela e dar-lhe o tempo necessário para se desenvolver. Depois, há que a colher, claro, e embalar e distribuir e faturar a 30, 60 ou 90 dias. Uma quantidade imensa de tempo e de energia para obter uns cêntimos que terás de dividir com o Estado, através dos impostos, para pagar os serviços comuns que agora nos são retirados porque a economia financeira tropeçou e há que tirá-la do buraco. A economia financeira não se contenta com a mais-valia do capitalismo clássico, precisa também do nosso sangue e está nele, por isso brinca com a nossa saúde pública e com a nossa educação e com a nossa justiça da mesma forma que um terrorista doentio, passo a redundância, brinca enfiando o cano da sua pistola no rabo do sequestrado.
Há já quatro anos que nos metem esse cano pelo rabo. E com a cumplicidade dos nossos.
Juan José Millas
in  
Dinheiro Vivo
 

sexta-feira, março 09, 2012

quinta-feira, março 08, 2012

Paxaxa com X.


Os pinguins estão a hibernar há muito tempo. 
E só voltam ao activo quando tiverem realmente algo de bom para partilhar.
Visitai este blog badalhoco por enquanto.